Lembro-me de, na minha infância, irmos às compras muito poucas vezes, era algo ocasional e que acontecia mesmo só quando era necessário.
É incrível como tudo mudou nos últimos 20 anos. As roupas tornaram-se mais baratas, os ciclos de tendência cada vez mais acelerados. Comprar roupa passou a ser uma forma de entretenimento, de passar o tempo, afogar as tristezas, compensar algo que está em falta.
Podemos por isso dizer que entrámos numa era de moda rápida – ou fast fashion – uma moda que consiste num padrão de produção e consumo no qual os produtos são fabricados, consumidos e descartados rapidamente. De repente tornou-se muito fácil comprarmos as últimas tendências das passerelles em meia dúzia de dias a preços baratos.
As grandes empresas internacionais de moda e redes de distribuição conseguem aliciar os consumidores graças à actualização constante das suas peças e aos baixos preços que praticam. Para além disso, conseguem analisar as compras que nós fazemos e utilizam esses dados como ponto de partida para produzir mais. A moda rápida nasce então com os seguintes objectivos:
- Oferecer ao cliente novas peças nas lojas com maior frequência;
- Adaptar os produtos aos gostos e necessidades dos consumidores;
- Levar o consumidor a comprar mais.
Do ponto de vista empresarial, isto parece ter lógica; contudo, por detrás deste modelo tão aliciante para nós, enquanto consumidores, estão ocultas realidades sociais e ambientais das quais muitas vezes não nos apercebemos.
Por isso mesmo, gostaria de partilhar contigo 10 factos sobre os impactos da indústria da moda.
1.
A indústria têxtil é responsável por 20% da contaminação das águas no conjunto de toda a actividade industrial do planeta.
A utilização intensiva de produtos químicos nos processos de extracção e cultivo de matérias-primas e de produção de fios, tecidos e roupas tem um grande impacto no meio ambiente, poluindo rios e mares.
2.
Para produzir uma t’shirt de algodão, por exemplo, são necessários 2700 litros de água.
As etapas de produção, assim como as fases seguintes do ciclo de vida das nossas roupas, requerem um uso intensivo de água, podendo provocar a sua escassez.
3.
A indústria têxtil é responsável por 10% do total de emissão de gás carbónico em todo o planeta e consome anualmente 1 trilhião de quilowatts/hora em energia.
A quantidade e o tipo de energia utilizados e das emissões geradas nas fases de produção, transporte, utilização e manutenção das peças de roupa são factores muito importantes que contribuem para a pegada ecológica da indústria da moda.
4.
Em 2017, foi revelado que o gigante da moda H&M — que tem promovido a sua agenda verde com pontos de reciclagem nas lojas e a produção da Conscious Collection — incinerou cerca de 19 toneladas de roupa obsoleta (o equivalente a 50.000 pares de calças de ganga).
Este é um dos perigos da produção desenfreada de roupa. Para onde vão as peças que não são escoadas?
5.
58% das fibras têxteis produzidas mundialmente são derivadas do petróleo.
Para além de depender de recursos finitos, o fabrico de matérias-primas e de produtos finalizados requer o uso cada vez mais intensivo da terra, que deixa de ser aproveitada para o cultivo de alimentos, por exemplo.
Lê também o artigo “O que é o movimento slow fashion?”
6.
O trabalhador que confecciona uma peça de roupa recebe entre 1% e 2% do preço de venda da peça.
O que se passa actualmente no sector têxtil com as condições de insalubridade e insegurança, a exploração dos trabalhadores e de menores de idade para a recolha de matérias-primas e produção, representa uma grande injustiça social e é (ou deveria ser) uma grande preocupação. No Bangladesh, por exemplo, mais de 1000 trabalhadores da indústria têxtil morreram com o colapso da fábrica de confecção de vestuário Rana Plaza, alertando as pessoas para as condições miseráveis em que os trabalhadores vivem e trabalham.
7.
Quarenta por cento dos resíduos têxteis são exportados para países do “Terceiro Mundo”, principalmente para o continente africano.
Muitas das peças que descartamos e que entregamos para reciclagem ou doação acabam, inevitavelmente, em países menos desenvolvidos. Daí ser tão importante prolongar ao máximo a vida útil das nossas peças e entregar para reciclagem apenas quando já não for possível reutilizar/transformar as peças.
8.
As plantações de algodão ocupam 2,4% da área cultivável do planeta, mas são responsáveis por 16% do consumo total de insecticidas.
O uso intensivo de produtos químicos na produção de fibras e tecidos, no fabrico de roupas e também na sua manutenção (detergentes, limpeza a seco, etc.) são nocivos para a nossa saúde. O uso destes produtos não só afecta os trabalhadores do sector têxtil como também as comunidades que vivem nas proximidades e nós enquanto consumidores.
“Estamos cada vez mais desligados das pessoas que confeccionam as nossas roupas, uma vez que 97% dos artigos são feitos no estrangeiro. Actualmente, há aproximadamente 40 milhões de trabalhadores têxteis no mundo, muitos dos quais não partilham os mesmos direitos e protecções que a maioria das pessoas no Ocidente. Representam alguns dos trabalhadores mais mal pagos no mundo e aproximadamente 85% de todos os trabalhadores têxteis são mulheres.” – The True Cost
9.
Globalmente, consumimos actualmente cerca de 80 mil milhões de novas peças de roupa todos os anos, mais de 400% do que consumíamos há 20 anos atrás.
Como dizia no início do artigo, e acredito que te identificas comigo, há 20 anos atrás comprávamos roupa apenas quando era necessário e não apenas por gostarmos de uma peça.
10.
As empresas de fast fashion desenham roupas que se desfazem rapidamente. Adoptam uma estratégia designada por “obsolescência programada”. Isto significa desenhar roupas que saem rapidamente de moda, se desgastam, perdem a forma ou desintegram-se facilmente para forçar os consumidores a continuar a comprar roupas novas.
É por esta razão que é tão importante teres em atenção os materiais e a qualidade das peças que compras. Lembra-te que a máxima da slow fashion é comprar menos e melhor.
Referências:
- Moda ética para um futuro sustentável de Elena Salcedo
- The True Cost
- Universidade de Queensland
- Huffington Post
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